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Rota Bahia-Minas: dos trilhos da história para as trilhas de aventura

Caminho da antiga ferrovia, da época do Brasil Imperial, volta à ativa e pode ser percorrido por ciclistas ou trilheiros em conexão com a natureza

Rota Bahia-Minas: dos trilhos da história para as trilhas de aventura
Por: em.com.br
postado em 07 de agosto de 2025

"Ponta de areia, ponto final,

da Bahia-Minas, estrada natural,

que ligava Minas, ao porto, ao mar,

caminho de ferro, mandaram arrancar".

A Ferrovia Bahia-Minas, imortalizada na canção "Ponta de Areia", de Milton Nascimento e Fernando Brant, foi uma importante linha ferroviária que conectava os estados da Bahia e Minas Gerais, no Brasil. Ela foi inaugurada em 25 de janeiro de 1881, no período imperial, cerca de oito anos antes de dom Pedro II deixar o trono e o Brasil. A ferrovia, essencial para o transporte de madeira e café, impulsionava o comércio, agilizava viagens e promovia o desenvolvimento. Contudo, sua história durou pouco mais de oito décadas, deixando saudades e hoje restando como um eco na paisagem dos vales do Jequitinhonha e Mucuri.

Rota Bahia-Minas: dos trilhos da história para as trilhas de aventura

Projeto de cicloturismo traça circuito por leito de ferrovia abandonada, que passa por túneis e cachoeiras - Foto: Alex Gangussu/Divulgação
 

A linha operava entre os municípios de Caravelas, no litoral sul da Bahia, e Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, cobrindo aproximadamente 600 quilômetros. Durante seus anos de operação, a ferrovia foi essencial para integrar áreas rurais e urbanas, facilitando o comércio e a mobilidade. No entanto, enfrentou desafios como custos elevados de manutenção e concorrência com o transporte rodoviário, que se intensificou nas décadas de 1950 e 1960.

Em 1966, após cerca de 27 anos em operação, a Ferrovia Bahia-Minas foi desativada devido à sua inviabilidade econômica. A decisão marcou o fim de uma era, mas a ferrovia permaneceu viva na memória cultural do país, especialmente por meio da música que celebra sua história.

E o caminho dos trilhos de uma antiga ferrovia pode ser percorrido por ciclistas ou trilheiros em busca de conexão com a natureza. Ao atravessar túneis, pontes e cânions, a região dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri emerge como uma nova opção turística.

Rota Bahia-Minas: dos trilhos da história para as trilhas de aventura

No caminho, córregos e cachoeiras garantem um refresco - Foto: Alex Gangussu/Divulgação

Justamente essa história, a estrada de ferro que ligava Araçuaí, interior de Minas Gerais, até o distrito de Ponta de Areia, em Caravelas, na Bahia, volta a entrar nos trilhos. A Rota Bahia-Minas – projeto desenvolvido pelo Sebrae Minas, com o apoio de diversas instituições, tem avançado. Entre os dias 24 e 28 de julho, o Sebrae Minas e o Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult), promoveram uma famtour que reuniu operadores de turismo dos estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Santa Catarina.

Os visitantes conheceram os atrativos e serviços turísticos do destino, para que possam vender melhor a rota. Por meio de caminhada, pedal e carro, o grupo percorreu 350km entre as cidades de Araçuaí, Novo Cruzeiro, Ladainha, Poté, Teófilo Otoni e Carlos Chagas.

A Rota Bahia-Minas vem sendo desenvolvida pelo Sebrae Minas desde 2018. Ao longo desses anos, foram promovidas capacitações e consultorias sobre design de experiências turísticas, implementação de receptivos, além de ações de inserção no mercado. “Nosso objetivo com a famtour foi o de apresentar a rota para operadores de diversas partes do Brasil que já comercializam destinos nacionais e internacionais. Com isso, esperamos que mais pessoas visitem a região e consumam nos pequenos negócios instalados ali”, destaca Marcelo de Souza e Silva, presidente do Conselho Deliberativo do Sebrae Minas.

Michèle Bruce, da Bike Ativa, de Curitiba, opera pacotes de cicloturismo há 18 anos. “Nossos clientes vão se emocionar muito. Entendemos que a rota vai além de uma viagem para ser feita de bicicleta, é um destino de experiência. A rota tem um grande diferencial que são as pessoas e as suas histórias”, observa.

Segundo o presidente da Associação de Empreendedores da Rota Turística Bahia-Minas, Wender Márcio, quem percorre a rota vive uma experiência de resgate da simplicidade e da brasilidade que ainda resiste no interior. “Mostramos para as agências o potencial turístico dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Quem visita nossa região encontra diversidade cultural, boas histórias, gastronomia e belezas naturais.”

A reativação do trecho da Rota Bahia-Minas começou em 2018, quando o Sebrae Minas apresentou um projeto de desenvolvimento regional que unisse municípios dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri. Por meio do programa ‘Check-in Turismo’ foram realizadas ações para a qualificação de empreendedores da região, para que pudessem oferecer melhores experiência aos turistas, atrair novos visitantes e gerar emprego e renda para as cidades.

Neste ano, a Rota é semifinalista no Prêmio Braztoa de Sustentabilidade, que reconhece e impulsiona práticas inovadoras e responsáveis de turismo em todo o Brasil. Os vencedores serão anunciados em dezembro. “Minas nasce no Norte, nos fluxos ancestrais que desciam pelos rios São Francisco e Jequitinhonha, nas trilhas abertas pelos povos originários e pelos primeiros povoamentos vindos da Bahia. A Rota Bahia-Minas é mais do que um percurso: é uma travessia simbólica que reconecta territórios históricos por meio da natureza viva e da memória que resiste em cada paisagem, em cada comunidade. Celebrando os Vales do Jequitinhonha e do Mucuri, esse projeto revela que a cultura e o turismo, juntos, não são apenas políticas públicas, mas caminhos profundos de pertencimento, identidade e desenvolvimento humano, social e econômico”, destaca o secretário de Estado de Cultura e Turismo de Minas Gerais, Leônidas de Oliveira.

350km de paisagens e histórias

O percurso da Rota Bahia-Minas reúne edificações históricas, como vilas, capelas, igrejas, estações e fazendas. A maior parte delas ainda está de pé, bem como dezenas de casas erguidas para os funcionários da antiga ferrovia.

Rota Bahia-Minas: dos trilhos da história para as trilhas de aventura

Um dos atrativos são os caminhos abertos por trechos de poucos aclives e declives - Foto: Alex Gangussu/Divulgação
  
O caminho também tem diversos pontilhões de ferro fundido, hoje adaptados para o tráfego de automóveis ou abandonados, mas mantendo muitas das suas características únicas, além de túneis centenários, riachos, lagoas, cachoeiras, e grandes formações rochosas, resultantes de milhões anos de ação da natureza.

Pela rota é possível apreciar a transição do bioma da caatinga para a mata atlântica. O turista encontra diferentes espécies de flora e fauna. Essa mistura também é sentida pela variação climática, aspectos que favorecem a prática do ecoturismo.

A rota é considerada intermodal, podendo ser feita por bike, caminhada, moto, carro ou até mesmo a cavalo.

A riqueza do Vale

O roteiro começa em Araçuaí, que abriga a última estação da estrada de ferro, finalizada em 1942. Por lá o turista encontra o Museu de Araçuaí, que conta um pouco da história do Vale do Jequitinhonha. O espaço foi criado por Frei Chico e pela artista Lira Marques, com a missão de revelar que a riqueza do território não está embaixo da terra, mas sim nas pessoas. No acervo tem objetos e documentos que registram a religiosidade, os usos, costumes e ofícios populares.

Rota Bahia-Minas: dos trilhos da história para as trilhas de aventura

A Rota Bahia-Minas vem sendo desenvolvida pelo Sebrae Minas desde 2018 - Foto: Alex Gangussu/Divulgação

Aline Sena é educadora do espaço e conta como a rota ampliou a oportunidade para difundir a história local. “Agora as pessoas daqui se veem e se sentem parte da história. É uma valorização local muito importante. O museu antes ficava fechado, agora implementamos bilheteria e conseguimos contratar uma funcionária para que o espaço fique aberto.”

Do museu, o turista segue para a estação de Engenheiro Schnoor, onde é possível apreciar trechos de estrada abertos entre as formações rochosas, conhecidas como cortes de pedras. O próximo destino é o distrito de Queixada, em Novo Cruzeiro, onde é possível apreciar iguarias típicas da região, preparadas no fogão de lenha da pensão da Dona Luiza. Já dentro da cidade, o destaque é o tradicional pastel.

Em Ladainha, as quedas d’água em meio à Mata Atlântica ajudam a relaxar e renovar as energias. A antiga estação de trem do município foi transformada em um ateliê pelo artista plástico Maelson Nunes.

Já em Poté fica a comunidade de Sucanga, onde está localizada a estação inaugurada em 1927, e que ainda conserva suas características originais. De lá, os visitantes seguem rumo à estação de Valão. A próxima cidade é Teófilo Otoni.

Paixão como oportunidade de negócio

Rota Bahia-Minas: dos trilhos da história para as trilhas de aventura

As antigas estações ferroviárias servem de ponta de apoio para os visitantes - Foto: Alex Gangussu

Em Pedro Versiani, zona rural de Teófilo Otoni, o turista encontra o Sítio Pé na Roça. Lá é possível conhecer a coleção de bicicletas do empreendedor Celso Souza. Na propriedade, ele criou o museu “As Kalanga Véia”, e também um receptivo de apoio, onde é servido café, bolos, quitandas e água de coco. Amante do ciclismo, reuniu um acervo de mais de 90 bicicletas separadas por tipos: mountain bike, para asfalto e exóticas.

Lugar de encantamento

Em Minas Gerais, a rota é finalizada no município de Carlos Chagas, que abriga a comunidade de Francisco Sá em seu território. Lá, os turistas são recebidos pelo Grupo Teatral Dramedia, que apresenta a peça “Trilhos de um Destino: A Força do Homem e do Vapor”. A peça é embalada por canções e histórias sobre José Joaquim de Amorim, construtor responsável pela ferrovia e a Estrada de Ferro Bahia-Minas.

Ainda em Francisco Sá o turista encontra a Rocinha Pouso e Café, opção de hospedagem e também um lugar para saborear a gastronomia da região. O empreendimento é gerenciado por Giovana Amorim, que tem sua vida entrelaçada com a Bahia-Minas.

Ao se aposentar das salas de aula, ela decidiu voltar às raízes da família. Junto com seu esposo e filho, abriu espaço em sua propriedade para hospedagem familiar, e passou a oferecer almoço com a típica carne de sol e também café e quitandas. como a empadinha de frango. “A receita é seguida à risca em nossa família, minha bisavó preparava, minha mãe vendia para os passageiros do trem e hoje eu mantenho a tradição servindo para os turistas”, conta Giovana. Segundo a empreendedora, no último ano mais de 100 turistas passaram pelo negócio familiar.

Viva a Bahia-Minas

Para conhecer mais, acesse o site www.rotabahiaminas.com.br e acompanhe as dicas de viagem, programação de eventos, indicações de meios de hospedagens e lugares para saborear a gastronomia da região.

Informações e agendamento pelo (33) 99985-2687 – Operadora Conexões.